terça-feira, 11 de outubro de 2005

Livro familiar

– Eu estava pensando como a vida é frágil. Tudo que construímos será ruínas, mesmo que tentemos passar nossas histórias de vida para nossos filhos, nossos netos e assim por diante. Um fato importante para mim, nunca terá igual importância para você. Envelhecemos sabendo disso e por isso sofremos.
– Deus deu ao homem um grande presente que o torna diferente dos animais comuns. Saber pensar. Porém, esse pensamento não é somente benigno. Através dele, as pessoas sabem que a vida é efêmera e sofrem ao saber que podem morrer a qualquer momento e perder tudo aquilo de bom que elas mesmas construíram.
Ouvi aquelas palavras e refleti o dia todo. Não compreendia direito o que elas significavam, mas sabia que eram verdadeiras. Gostava de saber que eu tinha minha família e meus amigos, sem lembrar que todos vão para nunca mais voltar. Sem saber que, no final das contas, eu estaria completamente sozinho.
Mais um dia começava. Passei a manhã inteira na escola, depois fui para casa. Almocei com minha família, estudei e, então, resolvi ir ver o que passava na televisão naquela hora. Mudei de canal diversas vezes até que uma notícia me chamou a atenção. Um senhor havia falecido, após ser atropelado por um automóvel. Assisti tudo com atenção.
Seu nome era José Alfredo, tinha cinqüenta e nove anos. Morava com a mulher e seu único filho, que era tetraplégico, numa bela casa em um bairro nobre. Trabalhava desde os nove anos na oficina do pai ajudando no que fosse possível. Havia perdido a vida por culpa de uma criação do próprio homem. As pessoas assistiam à sua morte com pena, mas tudo aquilo, logo seria esquecido. Uma pessoa comum deixava a mulher e o filho doente a mingua. Ninguém ligava mais para aquilo. A vida de José terminava ali, mas o tempo continuava a passar.
Ele estudou e trabalhou toda a sua vida para não dar a sua infância para seus futuros filhos. Não queria que faltasse nada à sua família, por isso dedicou cada segundo do seu tempo para projetar, não o seu futuro, mas o dos seus filhos. Sua maior dor era saber que morreria e não tinha tempo para aproveitar as belezas à sua volta. Queria ficar para sempre com seus pais, com sua esposa, todavia não podia.
José queria ser feliz. Superando todas as barreiras, ele construiu um mundo melhor para a mulher. Seu filho nasceu com uma doença sem cura. Não podia movimentar os membros e ficou fadado a residir em uma cama. José sofreu no começo, mas entendeu que aquilo fazia parte da vida. Ele construiu tudo aquilo para amenizar a doença de seu filho e fazê-lo viver sem dor.

Sua vida ficará registrada em um livro para que gerações futuras entendam que, apesar dos obstáculos e de sabermos que iremos dormir para sempre, devemos aproveitar tudo que nosso destino nos mostra. Cada chance é preciosa e saber agarrá-las é muito importante. A vida é um caminho com várias estradas, essa foi a lição que José Alfredo me mostrou.

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