terça-feira, 30 de julho de 2019

Furor

Há espinhos invisíveis ao seu lado, alfinetes ao seu toque.
Um silêncio agressivo, uma palavra doce envenenada.
É como se o ritmo das coisas estivesse acelerado.
Não há tempo de impedir o que está para acontecer.
Há fumaça num vulcão em erupção, e cinzas à sua volta.
Um meteoro e a cratera que se abre no colapso.
As cicatrizes na pele e a kintsukuroi na porcelana.
Há vontade de gritar até quebrar os vidros das janelas.
Bater a porta com toda a força do mundo e não abri-la (nunca) mais.
Enterrar o rosto nas almofadas macias de outrora e rasgá-las com os dentes.
Respirar em sintonia com os batimentos cardíacos.
Há penas, pelos, papéis, perfumes, pós.
O bem sendo mal, o mau sendo bom.
Um prazer agressivo seguido de culpa e de relaxamento.

quarta-feira, 29 de maio de 2019

Anedonia

Como um robô seguindo um trajeto em linha reta, por programação.
Modo automático, calculado para não errar.
Sem afeto, um objeto concreto criado por puro intelecto.
Matemática bruta, zero e um em caracteres pretos numa tela branca.
Não tem cor nem odor nem sabor nem calor.
Silêncio numa avenida barulhenta, planos deixados no papel.
Não dói, não cai, não faz, não pensa, mas continua.
Estátua móvel, fragmento de vidro caído ao chão em milhares de cacos.
Paleta de tons de cinza, passado que rumina, explosão de adrenalina.
Não é arte, não é gourmet, não é nada demais.
Entre o real e o fictício, entre a sombra e o que a define.
Um tanto faz vagante, pilastra grega que insiste em estar de pé ao amanhecer.